quarta-feira, 18 de novembro de 2015

COBERTURA XI PANORAMA INTERNACIONAL COISA DE CINEMA

 A segunda sessão do dia de sábado (31) do XI Panorama Internacional Coisa de Cinema teve o documentário como foco. Três produtos bastante diferentes entre si em temáticas e formas de abordagem, os filmes da sessão tinham por grande objetivo homenagear o cineasta Mário Peixoto e a cultura baiana e alertar para os problemas da seca no Nordeste do Brasil.




Uma boca cospe. Em escombros do que antes fora um prédio, uma mulher negra movimenta-se em uma performance hipnotizante antes de atacar a câmera fixa. Logo nos primeiros planos, Ifá, de Leonardo França, conquista o espectador pela fotografia e as cores. Os planos são intimistas, fazem o espectador refletir e acompanhar os movimentos da boca e de todo o corpo da mulher de forma poética. A saturação do filme salta aos olhos e chama a atenção para a imagem mostrada. Entretanto, durante os vinte minutos do filme, ele perde força e parece não saber que direção tomar. A mulher e sua poesia se misturam a uma conversa com um pai de santo e a uma contação muito didática de uma história de Orixás. Enquanto o homem fala, as imagens retratam exatamente o que o homem diz, não há ousadia no que se mostra, não há alegoria metafórica alguma e as planos acabam sendo forçados demais.


Mario Peixoto foi roteirista e diretor de um dos maiores e mais enigmáticos filmes da história do cinema brasileiro: Limite. Seu único longa-metragem. O curta Mar de Fogo homenageia o mestre e sua obra em nove minutos. A proposta de homenagear Peixoto e seu filme é, sem dúvidas, louvável, entretanto, a impressão é a de que o diretor Joel Pizzini aproveitou a onda que trouxe Limite à boca do povo europeu e americano quando Martin Scorsese restaurou o longa e resolveu realizar algum produto relacionado a isso para ter facilidades financeiras. Em preto e branco e com a real intenção de se aproximar do filme de Mario Peixoto, o curta não chega nem perto e tem uma proposta clássica demais. Nada parece ser dito com sutileza e, apesar de belas imagens recuperadas do filme, as referências ao longa se resumem a coloração do curta.


Seca. Fenômeno natural que se caracteriza pela ausência ou atraso das chuvas ou pela má distribuição da água. Problema enfrentado pelo no Nordeste brasileiro há décadas e que poderia ser considerado batido se a urgência em o debater não fosse perene. Seca, de Maria Augusta Ramos, o longa da noite, trata desse tema acompanhando um carro pipa pelo sertão. As histórias dos povoados e cidades por onde o carro passa, mesmo aquelas que parecem não ter muita relação com a água e com a seca, são narradas de forma natural. O filme possui várias características sempre vistas em filmes documentários tradicionais, daqueles que a massa está mais acostuma a assistir, como: iluminação natural, acompanhamento do cotidiano dos personagens, planos abertos que contextualizam o espectador.
O que se vê de diferente em Seca é a ausência de qualquer depoimento. As histórias são contadas a partir de imagens, sem a necessidade de qualquer narração, diferente e mais eficiente do que feito no curta Ifá. Nos momentos onde os depoimentos seriam cabíveis, existem conversas entre o homem que guia o carro pipa e algum morador que recebe a agua, entre um morador e outro, entre familiares. Outro ponto forte do filme é deixar clara a necessidade de ainda se falar sobre a seca em produtos audiovisuais que cheguem ao público e que conscientizem. Apesar disso, e apesar do título, o filme peca ao retratar uma história com esperança demais e crítica de menos. Na ânsia de se falar sobre todo o contexto da seca no Nordeste, o longa fala sobre água, sobre política, sobre fé, sobre esforços, sobre medidas, e não foca em nenhum deles.



Ifá poderia ter ido além do que se diz e ousado mais nas imagens que apresentou, misturando os elementos do candomblé e retratando a história contada pelo personagem de forma mais poética, como a dança da mulher negra do início do filme. Mar de Fogo destoa de outros trabalhos de Joel Pizzini e seria mais interessante se optasse por manter a estética muda do filme Limite, obra prima do homenageado Mario Peixoto. Seca se perde em tantas informações e poderia optar por uma temática de denúncia, como por exemplo, ser mais incisivo em como a politicagem agrava os problemas da seca no Nordeste. Com três filmes com propostas bastante interessantes, a noite de sábado acabou sendo a mais decepcionante do Panorama.

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