sábado, 17 de agosto de 2013

064. TAXI DRIVER, de Martin Scorsese

Martin Scorsese e Robert De Niro mostram que juntos são os novaiorquinos mais geniais de todos os tempos!
Nota: DEZ


Título Original: Taxi Driver
Direção: Martin Scorsese
Elenco: Robert De Niro, Cybill Shepherd, Jodie Foster, Peter Boyle, Harvey Keitel, Leonard Harris, Albert Broks, Martin Scorsese, Victor Argo, Steven Prince
Produção: Phillip M. Goldfarb, Julia Phillips e Michael Phillips
Roteiro: Paul Sharader
Ano: 1976
Duração: 113 min.
Gênero: Drama / Thriller

Tavis Bickle é um homem como qualquer outro que vive na terrível Nova York dos anos 1970. O maior problema de Travis, entretanto, é que já não consegue mais dormir, dessa forma, o rapaz, de 26 anos, alegando que já esteve no Corpo de Fuzileiros Navais, torna-se taxista no turno da madrugada. Nesse contexto, Travis perambula pelas ruas da “cidade que nunca dorme” e torna-se obcecado por duas jovens: uma prostituta de 12 anos, Iris, e uma bela mulher que trabalha em comitê eleitoral, Betsy. Porém, o que não se pode imaginar, é que essas obsessões farão Travis cometer insanidades, inclusive estar disposto a matar.


“Taxi Driver” é considerado, por muitos críticos, o maior filme da carreira do diretor Martin Scorsese. Para mim, é, sem dúvida, o mais complexo e reflexivo. Tal complexidade e reflexão já começam no início do longa: a abertura apresentada com a música de Bernard Herrmann ao fundo é algo inexplicável e maravilhoso, ainda mais para quem já assistiu ao clássico “Psicose”, com trilha sonora de Herrmann. Após isso vemos, as perturbações inicias de Travis, como seu passatempo de ir assistir a filmes pornográficos durante a madrugada em cinemas imundos e a desorganização de seu apartamento que parece ser em uma zona bem pobre da cidade. Se pensarmos um pouco, é rápido perceber como a vida do protagonista é ruim e como ele está alienado para dezenas de acontecimentos a sua volta. Com o passar do longa, a obsessão para com Betsy e com Iris nos trazem muitas verdades: Travis está apaixonado por elas? Travis sente atração sexual por elas? Travis sente alguma afeição profunda por alguma das jovens? O protagonista precisa ser cuidado e cuidar de alguém? Travis está se sentindo sozinho e quer companhia? Na minha opinião, Travis encontra em Iris e Betsy alguém por quem vale a penas lutar e viver, enquanto Betsy tem sua vida chata trabalhando todos os dias e tendo que dar foras diários em um colega insistente, Iris está subordinada a Sport, o cafetão que manda nas prostituas da região onde Iris trabalha, e Travis sente que pode ser o herói dessas duas mulheres. Além disso, da mesma forma que Iris está ligada e deve obedecer Sport, Betsy está ligada ao Senador Palantine, e, provavelmente, Travis se enche de ciúmes de ambos. Por fim, não se pode deixar de falar, a respeito da construção de Travis, um dos personagens mais enigmáticos e bem compostos da história do cinema, da forma como ele vê o mundo e como se porta diante de tudo. Como já disse, temos a passatempo básico, que já o caracteriza como um homem oprimido que não parece ter uma vida sexual muito regrada, a vida social do protagonista gira, durante o longa todo, em torno dos rapazes com quem trabalha na companhia de táxi, o que demonstra que anteriormente ao trabalho na tal garagem, Travis não tinha nenhum amigo – até por que, em momento algum faz-se referência a alguma relação mais estreita por parte do personagem. Nova York, para Travis, é um lugar sujo, um lugar onde toda a escória do planeta resolveu habitar e parece que veio sem pretensão alguma de sair dali. Em uma das cenas mais antológicas do cinema moderno – onde vemos Travis dirigindo pelas ruas de Nova York e refletindo o quanto aquela cidade está suja e como uma limpeza é necessária para que tudo fique melhor – vemos, claramente, como o rapaz está enojado por viver ali, como tem certos preconceitos e como e vida suburbana é um verdadeiro lixo.


Martin Scorsese é um dos diretores mais renomados da Sétima Arte e um dos mais ativos no momento. Em 1973, “Caminhos Perigosos”, com De Niro, foi seu primeiro filme de sucesso a ser lançado no cinema, mas foi 1974 o ano decisivo para o diretor e o ano que lhe rendeu um posto entre os maiores diretores da década de 1970 – aquela geração “sexo, drogas e rock’nroll” que salvou o cinema da mesmice e trouxe uma nova forma de se ver o mundo e de se filmar, dentre eles ainda estavam George Lucas, Fancis Ford Coppola, Steven Spielberg, Stanley Kubrick, Brian de Palma, entre outros. Foi nesse ano que Scorsese provou seu talento nato ao lançar “Alice Não Mora Mais Aqui”, com Ellen Burstyn, e “Taxi Driver”. “Taxi Driver” não foi apenas mais um filme ao lado de seu grande parceiro Robert De Niro, foi o longa que lhe deu a passagem garantida para realizar qualquer produção no cinema, teve 4 indicações ao Oscar, foi indicado no Sindicato dos Diretores da América, no Globo de Ouro e no Sindicato dos Roteiristas da América, levando prêmios como o dos Críticos de Nova York, da Associação Nacional dos Críticos de Filmes dos Estados Unidos e destacou-se no Festival de Cannes, rendendo a Scorsese o Palma de Ouro. Não é para menos, ninguém, jamais havia delatado de forma tão crítica e debochada os problemas de Nova York, ou exaltado a cultura da época. Aliás, se me perguntassem palavras chave a respeito desse longa, as primeiras que diria, seriam Nova York e crítica e sátira social. O diretor faz inúmeras referências a cenas clássicas e clichês de Hollywood, e ainda nos traz cenas que seriam copiadas para sempre, sendo original e fantástico. A forma obscura com a qual foram gravadas as cenas de Travis trabalhando na madrugada, no prédio onde as prostituas trabalham e nos cinemas pornôs se contrasta com as cenas de Travis se encontrando com Betsy e na tentativa de assassinato de Palantine. Concluindo, nada poderia ser mais bem vindo nesse longa que a trilha sonora impecável de Herrmann, um dos compositores mais controversos e admiráveis do cinema, suas músicas são propícias e nada pode lembrar mais o subúrbio de Nova York que elas. Herrmann foi indicado ao Oscar e ao Grammy pelo trabalho.


Poucas coisas são mais agradáveis na vida para mim do que assistir a um ator ou atriz veterano em algum filme do início de sua carreira. Aqui temos dois casos desses. Primeiramente, o protagonista Travis, que é interpretado com maestria por Robert De Niro, em uma atuação que eu costumo chamar de assombrosa por ser tão perfeita e inigualável. Para começar, a forma como De Niro muda fisicamente durante o longa é algo maravilhoso e feito de forma competente por pouquíssimos atores. Mas a mudança física do ator está longe de ser o melhor de sua interpretação: De Niro demonstra os problemas e anseios do protagonista em cada feição, cada gesto e trejeito e até mesmo na hora de falar. Aquela ironia e crítica que citei anteriormente são vistas no personagem pela forma com a qual o ator fala, sorri e por suas frases clássicas, dentre elas mais uma cena inesquecível, na qual o personagem, olhando-se no espelho, indaga: “Você está falando... comigo?”, claro que a forma de De Niro é mais convincente e divertida do que poderia explicar apenas com esse texto. Finalmente, a forma de andar, de falar, de sorrir e de se portar diante de tudo mostra o quanto Travis está infeliz e como morar em Nova York é um suplício, isso, por que, de forma, mais uma vez, perfeita, De Niro consegue trazer as aflições de um jovem de 26 anos que deseja fazer algo realmente interessante pela humanidade, nos presenteando com mais uma cena maravilhosa. Ao lado de De Niro está Jodie Foster, no papel de Iris, uma menina que fugiu de casa por já não aguentar mais viver com os pais, mas que acaba vendo que nem mesmo sua paixão por Sport a fará continuar com sua vida para sempre. Foster iniciou sua carreira aos sete anos de idade, aqui, com 12, mesmo aparecendo poucas vezes no longa – é necessário dizer que sua personagem é essencial para o desenrolar da trama -, foi indicada ao Oscar melhor atriz coadjuvante. Cybil Shepherd, a Jacy Farrow do clássico “A Última Sessão de Cinema” (1971), vive Betsy, uma jovem ambiciosa que sabe a beleza que tem. Shepherd está ótima no papel, começando por sua beleza inquestionável e pela forma doce com a qual se porta durante todo o longa, atribuindo decência e classe, que se contrapõe com o perfil de prostituta de Iris e com toda a sujeira de Nova York. Não há como não citar, rapidamente, a grande aparição de Martin Scorsese no filme, que vai além de apenas um vulto na multidão, ele é um homem que acha que está sendo traído pela esposa com um homem negro, ser traído já é triste, nesse contexto, ser traído com um homem negro é a pior coisa que pode acontecer a alguém, e é bem isso que Scorsese deixa claro com um personagem perturbado e completamente louco.




O desfecho de “Taxi Driver” é uma das maiores incógnitas dos filmes da época. Não sabemos se Travis está sonhando, se está tendo alguma espécie de visão do futuro, se é o que ele deseja que aconteça que está acontecendo, se é realidade, se é pura ficção, se Travis enlouqueceu de vez, se o protagonista está morto ou vivo. Na realidade, é difícil dizer o que é totalmente real nesse filme e o que é pura ficção, pura imaginação da cabeça perturbada de Travis, e nisso incluo o personagem de Scorsese. Para se ter uma idéia do quanto isso tudo enlouqueceu o público e como esse filme foi marcante para a sociedade da época, foi provado que John Hincley, homem que tentou assassinar o presidente Ronald Reagan, estava motivado por duas coisas: uma paixão doentia pela atriz Jodie Foster – foi comprovado que Hincley sofria de erotomania, ou Síndrome de Clérambault – e pelo filme “Taxi Driver”, decidindo que estaria a altura de Foster caso fosse uma figura conhecida nacionalmente, e, para isso, deveria matar um presidente. Assassinar Palantine, tendo em vista que Betsy passara a desprezar Travis, significava ficar famoso e estar a altura de Betsy. O que não se podia esperar era que Travis faria tudo errado e, de alguma forma, conseguiria fazer tudo como planejado para ficar famoso e se tornar um heroi. No desfecho, portanto, parece que Travis já não se importa mais com Betsy e que tudo acabou bem, que ele não precisa mais da moça e está pronto para seguir em frente. Ou não, afinal, podemos verificar o mais importante do longa em todo seu desenrolar: Travis é um homem bom, o problema é a sociedade em que vive, que o corrompe a cada instante, ditando regras e fazendo com que o jovem reprimido deseje ser alguém importante e conhecido. Não seria muito mais fácil e correto simplesmente continuar seguindo nossas vidas sem tais influências insuportáveis?


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